quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

MONOGRAFIA DA FELICIDADE CONJUGAL

Estou completando 22 anos de casado. Que a felicidade conjugal não é um estado permanente, como induziam os contos de fadas com o clássico final de “viveram felizes para sempre”, todos aprendem rapidamente na primeira relação amorosa real que vivenciam. A questão que se coloca aqui é a de questionarmos os poetas que tanto falam de amor, para sabermos quantitativamente por quanto tempo se é feliz conjugalmente. Com este estudo queremos saber se o estado de felicidade ocorre na maioria dos dias ou se, ao contrário, o refrão “felizes para sempre” se refere à minoria dos dias de nossas vidas afetivas em comum.
 Antes de podermos efetuar esta análise precisamos delimitar as fronteiras internas que caracterizam estágios específicos e diferenciados das relações afetivas: 1) – O estágio da paixão; 2) – O estágio de adaptações e instabilidades; 3) – O estágio do amor serenamente eterno. O universo que interessa como objeto deste estudo  é o estágio de adaptações e instabilidades, uma vez que no estágio da paixão a sensação de  felicidade é mais permanente por estarmos  dopados pelas endorfinas e que, no estágio do amor serenamente eterno, geralmente prevalecem mais os costumes adquiridos a custo de muito sofrimento no processo de adaptação, onde não sofrer passa a ser sinônimo de felicidade.
Definida caracterização genérica do nosso campo de pesquisa, é preciso estabelecer os parâmetros que identifiquem a população alvo para a aplicação do “questionário” de coleta de dados. De acordo com a sabedoria popular, que tem seus fundamentos em experiências seculares da humanidade (e os estudos psicológicos conjugais os confirmam), há notoriamente uma chamada “crise dos sete anos” em que muitos casais se separam e outra crise aos dez anos de convívio. Para fins práticos vamos adotar como parâmetros do estágio de adaptações e instabilidades do nosso grupo de estudos os casais que tenham entre sete e doze anos de relacionamento afetivo-amoroso.
 Nosso objeto de investigação, portanto, é definido como casais em permanente “estado de crise”. Em um grupo amplo destes casais, todos de classe média, fizemos uma sondagem expedita, perguntando simplesmente qual é a relação entre a quantidade de dias ruins, dias regulares e dias ótimos na relação do casal, e qual o critério que utilizam para efetuar esta avaliação de qualidade. O resultado desta sondagem, que adotamos como nossa hipótese inicial, foi surpreendente: 3 dias ruins e 3 dias regulares para 1 dia ótimo na semana. Quanto aos critérios para esta avaliação, sistematizamos que em geral os casais relacionavam como ruins aqueles dias em que os corpos e os olhares estavam se repelindo (repulsão), como dias regulares aqueles em que os corpos e olhares estavam indiferentes (neutros) e como dias ótimos aqueles em que os corpos e os olhares estavam se atraindo (atração), nos quais havia troca de carinhos, ereções e ou sexo com orgasmo unilateral ou de ambos.
Deste objeto de investigação selecionamos um grupo mais restrito para aplicarmos o instrumento de coleta de dados, o qual consistia em anotar diariamente numa planilha como cada um avaliava o seu dia de convivência conjugal, segundo os critérios sistematizados. A pesquisa se desenvolveu ao longo de quatro meses (16 semanas), buscando agregar um perfil bem significativo do comportamento médio dos casais.
Como resultado da aplicação deste instrumento, pudemos quantificar dois aspectos inter-relacionados que constituem a sensação de felicidade conjugal, quais sejam, o humor e a sexualidade do casal. No aspecto do humor, constatamos uma média de 28% dos dias como em estado de repulsão, 35% como dias neutros e 37% como dias em estado de harmonia e atração conjugal. No aspecto da sexualidade verificamos uma média total de 24 relações sexuais por casal no período, o que implica uma média de 1,5  relações sexuais por semana, sendo que em 70%  dos atos sexuais houve orgasmo tanto masculino como feminino, e  em 30% houve apenas o orgasmo masculino.
A conclusão deste ensaio ficcional de monografia sobre a felicidade conjugal contrariou a hipótese inicial, resultante da sondagem expedita que indicava que o relacionamento afetivo do sujeito da investigação apresentava 3 dias ruins e 3 dias regulares para 1 dia ótimo na semana. Verificou-se que esta relação está bem mais equilibrada, havendo um ligeiro predomínio da quantidade de dias neutros (35%) sobre os dias de repulsão (28%) e, principalmente, invertendo a hipótese inicial, com a predominância dos dias felizes de atração (37%) sobre os demais estados de humor da relação afetiva. Verificou-se que a relação conjugal é quase de um dia ruim, para um regular e para um ótimo.
Por fim, voltamos à questão colocada inicialmente, de se saber quantitativamente por quanto tempo se é feliz na vida conjugal, isto é, se o estado de felicidade ocorre na maioria dos dias ou se é ao contrário. O clássico “felizes para sempre” constatamos que não se realiza na maioria do tempo, pois que se verificou que a felicidade ocorre em 37% dos dias. Mas a questão inicial também não pode ser respondida como se a felicidade ocorresse na minoria do tempo, cerca de um terço dos dias apenas. Seria preciso considerar a perspectiva do estágio seguinte das relações, o do amor serenamente eterno. Nesse estágio, para o qual todas as relações longas se dirigem inexoravelmente, os estados neutros de humor não constituem sofrimento e logo não podem ser computados como o oposto da felicidade.
Portanto, nesta perspectiva a longo prazo, estatisticamente os dias felizes realmente passam a ocorrer na maioria no tempo da vida conjugal, o que justifica metaforicamente o encantado final feliz: E viveram felizes para sempre...na trilha dos ajustes intermináveis que levam ao amor serenamente eterno.

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