domingo, 26 de janeiro de 2014

CRÔNICA DAS CRÔNICAS

           De todos os indicativos de vocações naturais que se manifestaram desde a minha juventude, o de escrever sempre se destacou, mas nunca se vislumbrou uma possível opção prática, em termos profissionais, para esta vocação natural: escrever o quê? Após vários ensaios, ainda jovem,  pelas diferentes modalidades de aplicação desta propriedade de “escrever”, tentei fazer poesia, dramaturgia e contos. Por comodidade, acabei adotando a poesia como instrumento “provisório” de expressão intimista, até que alguma outra coisa acontecesse em termos de oportunidade prática e útil para esta manifestação.
            Transcorrido mais de meia vida, onde o ganha-pão foi buscado e garantido por outros caminhos, a problemática não resolvida da adolescência volta a se colocar: o que eu quero ser quando crescer? Modernamente a concorrência é tanta no mercado de trabalho que esta expressão assumiu outro significado: o quê eu realmente quero fazer  agora que estou aposentado?
O que fazer com esta vocação natural que resistiu ao tempo, ao curso de engenharia, à carreira profissional e ao envolvimento com a família e os filhos? Escrever o quê? Com a perspectiva da terceiridade,  pela vivência conosco mesmos e com o mundo real que nos rodeia, conhecemos melhor os mecanismos de ambos e de como interagem em sociedade. A tendência natural e lógica é buscar naquelas atividades que fazemos por hobby, por puro prazer pessoal, uma especialização que nos mantenha úteis e integrados com a sociedade e, finalmente, com alguma satisfação. Além disso, de preferência, que esta nova atividade renda alguns retornos, nem que seja meramente de reconhecimento pessoal (que é o meu caso!), se não der para render alguma grana para reforçar a aposentadoria, que sempre é minguada neste lado debaixo do Equador.
Dizem que o futuro só a Deus pertence; mas a gente vai mexendo com os pauzinhos e induzindo a vontade dele de modo a convergir com a nossa que, afinal, dizem, somos feitos à sua semelhança. Hoje percebo que, de todas as formas literárias de escrever, por suas características de objetividade e de  brevidade, o gênero Crônicas é o que sempre mais me atraiu, sobretudo jornalisticamente. Por este gênero de crônicas jornalísticas já passaram um Machado de Assis e um Nelson Rodrigues até chegarmos num Luis Fernando Veríssimo e num Juremir Machado da Silva, cara que consegue escrever todos os dias pelo menos uma crônica no jornal. A crônica é um vastíssimo campo criativo e um bom mercado de circulação  para o texto, mas que exige principalmente maturidade, além de algum talento, pois no universo da prosa a crônica é a expressão mais próxima da poesia.
Contudo, com talento amador de praticante da várzea, depois de tantos e tantos anos de aprendizado com a confecção de poemas, uma vez adquirida a maturidade quarentona, a cinquentenária e agora sexagenária, é hora de aventurar-se neste temido mar com monstros de sete cabeças,  que emergem dissimulados a todo momento no cotidiano da nossa comunidade ou civilização. A crônica pode ser o instantâneo de um poema ou o flash de uma fotografia, quando eterniza literariamente um fato comum, dando-nos a dimensão universal  que este fato pode ter em sua  humanidade. Captar estes temas na mídia, na rua, na vida e traduzi-los para um formato jornalístico ou literário é a grande sacada, ou como diria o poeta, é a grande inspiração do cronista.
Com humildade de aprendiz de feiticeiro, a partir desta crônica sobre as crônicas, estou iniciando um novo ciclo onde será preciso muita perseverança para não desacorçoar diante desta árdua busca de fazer alguma coisa de útil com esta vocação de gostar de escrever e de, finalmente aposentado, se aventurar a escrever o que vier na cabeça!   Caros leitores do Diário de Um AposentaNdo, não me abandonem, não me deixem só nesta empreitada. Prometo manter postagens alternadas nos dois blogs, o Diário e este de Crônicas Avulsas no Tempo, aqui utilizando na estética conceitual das ilustrações as fotografias que fiz de paisagens, ângulos e detalhes de Porto Alegre, como o mapa desta “cidade do meu andar”. Façamos juntos esta travessia,  da margem concreta do mundo do trabalho para a margem ficcional e literária do nosso “sentimento do mundo”, com as suas intrínsecas relações afetivas e transcendentais.  
Apertem os cintos,  vamos voar nas asas da imaginação!

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